Tarefas (Clênio Pereira)*



Não vim à vida amansar carneiros.
Vim certo, ligeiro, trazer tarefas de mim,
prostrado, confuso ante a efervescência
mística da vida.

Não estou de mãos atadas.
Conservo as boas falas
de todos os velhos amigos,
as lembranças dos doces de leite
e do requeijão polpudo e cheio de sardas.

Dispus, aos companheiros, da minha esperança
e encomendei outra aos novos amigos.

As mulheres que me experimentaram o gosto de mel
não esgotaram por completo
suas reminiscências de fel.

Não vim à vida para compor régias canções,
revolver dogmas da aritmética,
escudar os heróis em sua benignidade de órfãos,
Não quero registrar as guerras,
inventos e desajustes deste tempo.

Não recebi um recado
do motivo de viver.
A cada tarde,
sorvo uma dose de atrevimento e me recordo
de alguns nomes que geografaram minha existência.

Não tenho certeza,
por isso que vim à vida

e luto por ela.


* Poema de autoria do meu irmão Clênio Pereira, falecido em 1984, aos 25 anos de idade.

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